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A "Angustiolândia" de Romulo Narducci


O Cadernos do Leste trocou uma ideia com o escritor Romulo Narducci que acabou de lançar, fresquinho, fresquinho, seu Angustiolândia, livro que reúne 13 contos ambientados nas esquinas soturnas de nossa existência. Nascido em Niterói, em 8 de novembro de 1975, e criado em São Gonçalo, Romulo Narducci é autor da peça que o apresentou ao público pela primeira vez chamada “Dissolvendo Sombras”, em 2003, e dos livros de poesia de produção independente “Orações Licenciosas (Ou Cancioneiro Erótico)”, em 2008, e “Tudo Que Morre é Consumado”, em 2010. Publicou o seu primeiro conto chamado “Um Sax Tenor”, em 2012, na coletânea “FLUPP Pensa – 43 novos autores”. Em 2013 e 2014, participou das coletâneas “Antologia de Poetas Gonçalenses” e “2ª Antologia de Poetas Gonçalenses”, organizadas pela Secretaria Municipal de Cultura de São Gonçalo. Em 2014, também participou da coletânea de poesia “15 Anos de Um Brinde à Poesia”, organizado pela poeta Lucília Dowslley, em Niterói. É também um dos idealizadores dos eventos mensais de poesia “Uma Noite na Taverna” (que acontece desde 2004 na cidade de São Gonçalo) e “Viva Poesia Viva” (desde outubro de 2014 na Biblioteca Pública de Niterói), já tendo organizado e participado de outros inúmeros saraus e eventos literários, em destaque O Sarau de Ideias ocorrido em novembro no quiosque da Rede Globo e várias edições dos eventos Um Brinde à Poesia e Corujão da Poesia. “Angustiolândia (Ou de bares, ruas e bordéis)” é o seu primeiro livro de contos. O título se define em sua epígrafe como “...um lugar distante, na próxima esquina, dentro de um copo vazio de cerveja, ou quem sabe, dentro de você.” Deduz-se na primeira impressão, diante da nomenclatura que provém do sentimento intenso que rege o ser humano, que é a angústia, de que “Angustiolândia” não é um lugar específico, porém, o leitor pode marchar para lá, deitar-se com prostitutas, comer de lixo com um mendigo, pecar, conhecer drogas novas e viver aventuras pueris, como jogar bola e ter os primeiros contatos íntimos, ainda na infância. O livro reúne 13 contos do autor, que com doses de ironia e algum humor negro, sustenta uma verdade grossa e voraz que empurra a grosso verbo pela goela da sociedade. Aborda temas sobre o lado obscuro da boemia, problemas sociais e comportamentais de uma sociedade nefasta cercada de bêbados, vadios, loucos, tarados e uma bruxa que até pode ser de verdade. A angústia do ser humano é o ponto principal de suas histórias, onde os personagens não transitam pelo maniqueísmo clichê, assumindo cada qual o seu papel que lhe convém sobre a desgraça alheia. “O inferno são os outros”, disse Sartre, e nesse conjunto de histórias o leitor terá a certeza disso. A ENTREVISTA Cadernos do Leste

Um leitor atento lê o título de sua obra Angustiolândia (Ou de bares, ruas e bordeis) e logo imagina um território ou um mundo de angústias que são inerentes à nossa jornada, portanto, nada imaginárias. onde fica a Angustiolândia?

Romulo Narducci É uma questão de saber onde fica a dor de cada um. Em algumas pessoas doem de forma introspectiva, outras buscam afogar essa angústia de outras maneiras. Angustiolândia não é um lugar de fato e sim uma viagem para dentro dos conceitos pré-estabelecidos de cada um. O livro conta a angústia de vários personagens, eles não são pessoas exemplares, e o leitor ou se identifica em sua dor com eles ou vai julgá-los como convém, porém pra isso, tem que seguir para lá, marchar para Angustiolândia, que é um caminho que não tem chegada, mas pode ter um propósito, a catarse.

Dentro da literatura psicanalítica, a angústia tem muito a ver com nossos limites/fronteiras morais/religiosos impostos sobretudo pela nossa família frente ao mundo social. É a famosa escolha entre o “certo” e o “errado” que temos que fazer a todo o tempo e invariavelmente imersos na mais profunda solidão. Escolhas existenciais que podem valer para uma vida inteira ou a escolha de trair ou não a sua mulher numa noite aparentemente sem importância. A sua obra/personagens vão por esse caminho?

Na verdade, são muitos os caminhos da angústia tratados nessa obra. A questão em si dos valores impostos pela sociedade são quebrados, mostrando que vivemos num mundo onde os valores são condutas de organização, mas que também podemos pirar. Quem já não pirou? Com o simples dia-a-dia que nos faz sentir como a um ruminante pertencendo a um enorme gado? Quem já não cometeu loucuras com álcool, ou com drogas, ou até mesmo os mais puritanos, com desejos guardados? São diversos contos que mostram variadas situações e vários tipos de personagens que representam pessoas e estilos de vida diferentes. Mas ali, frequentando ruas num simples bate-bola, ou as sarjetas, ou bordéis, são sim escolhas, as de alguns que moram nessa angustiolândia, pois a vida é feita de escolhas e as escolhas nos dão a carta da experiência e a vivência de mundo. Sabemos o que é certo ou errado por questões de moral e cívica, mas quando estamos diante de algumas situações é que sentimos na carne e na alma o que determinada atitude vai reverberar. Uns quando traçam caminhos tortuosos, até gostam. E querem morar eternamente em sua angustiolândia.

Você é um homem de letras e construiu ao longo do tempo uma obra densa dentro da narrativa poética. Esse é o seu primeiro livro de contos, que tem um outro feeling literário, uma outra pegada. Não há muito tempo houve na Rússia uma discussão calorosa entre um amante da poesia e outro da prosa. O final da história foi o esfaqueamento até a morte do defensor da prosa. Qual a diferença entre um e outro para o autor, e entre um e outro para o leitor?

Para se ter uma ideia, curiosamente a dedicação do meu livro, em suas primeiras páginas, vem dizendo: “Em memória de mim.” Sim, a cada livro morre um pouco de mim e fica ali, guardadas ideias como cinzas em uma urna, pronta para ser aberta e as ideias espalhadas ao vento. E que essas ideias espalhadas voem longe, assim espero. Sou poeta desde os 14 anos, mas também sempre gostei de escrever, pois uma das minhas influências, além do cinema, são as histórias em quadrinhos. Criava personagens, escrevia roteiro para colegas que sabiam desenhar na escola, então já tinha uma inventividade para com a prosa desde cedo também. Até antes mesmo do que com a poesia. Venho há muito tempo escrevendo contos e já adianto que estou mergulhado num romance, o meu primeiro. Tem gente que tem dificuldade para poesia e mergulha na prosa, ou vice versa, eu não sei o que é bem isso, até música já compus, já fui um péssimo guitarrista de uma boa banda chamada Divina Comédia. Compunha letras com o vocalista Alex Devillart que colocava as melodias. Foi questão de costume e exercício natural. No final, poesia e prosa são fundamentais, cada qual em sua vertente, e tudo é literatura, tudo é arte. Os russos poderiam, ao invés de brigar, saírem abraçados para o próximo bar e enquanto tomassem uma dose de boa cerva, um contemplar o texto do outro.

Há anos você, com os amigos Rodrigo Santos e Henrique Pakkato, promovem a ‘Taverna’ (Uma Noite na Taverna) em São Gonçalo. Ali vocês podem medir in loco o desenvolvimento da literatura na cidade, tanto pelo seu lado artístico, como pelo lado do produto de consumo. Em outras palavras, a avaliação da cena dos autores e dos leitores. Como você faz esse balanço, teria um?

Bem, para começar, o Brasil é um pais de não-leitores. Ser escritor num país assim, é muito complicado, ainda mais quando você não vem de uma família já conhecida no rol da fama. Em São Gonçalo não poderia ser diferente. Um município com mais de 1 milhão de habitantes que tem como cultura, - em grande parte da população -, a cultura popularesca veiculada pelas grandes mídias de massa. O trabalho com a Taverna tem 11 anos, e são 11 anos de formação de público. Tivemos muitos depoimentos de pessoas que sequer sabiam o que era poesia e hoje são leitores. Esse é o papel de um evento. Literatura como produto, já é complicado, pois livros são muito caros. Em nossa cidade temos 1 livraria de tradição que é a Ler é Arte e outras que são franquias de grandes e médias livrarias, nos shoppings da cidade. Público para literatura tem, enxuto, mas tem, em qualquer lugar, mesmo o leitor dos Best-Sellers medievais. Mas que os leia! Pelo menos vai ter contato com o livro. Escritores e poetas em São Gonçalo temos muitos. Mas onde fica o interesse dos empresários e das editoras? Mas também carece de formação de público. A Taverna faz a sua parte, outros eventos de poesia na cidade também fazem, agora depende também de instâncias superiores que têm a faca e o queijo na mão, ah... o Poder Público...

De que forma o poder público pode chegar junto?

Abrindo editais, cursos de formação em produção cultural, estreitando o contato do artista com o empresário, enfim, tudo o que o Poder Público tem como missão fazer em prol da cultura. Até vejo uma força motriz, uma força de vontade na atual secretaria de cultura, mas sempre falta verba para eventos. E mesmo assim uma ou outra coisa estão espocando pela cidade. Mas o governo no geral, ele todo, tem que estar envolvido. Cultura e arte geram divisas e dá retorno para o município. Isso é fato! Mas tem que ter um envolvimento total do Poder Público.

Dinheiro, por exemplo, que não falta na Secretaria de Educação. Recentemente a secretaria adquiriu (sem licitação) o programa “Magia de Ler” da Editora Melhoramentos por R$ 12 milhões. O programa consiste basicamente em implantar a cultura da leitura nas escolas do ensino fundamental. Foi um ato absolutamente solitário do secretário. Uma surpresa para muita gente, o que acabou gerando indignação...

Ao saber disso também fico indignado. Já que teve essa verba, onde na prática está acontecendo o projeto? Bem, mas para não perdermos o foco do livro Angustiolândia e virar uma entrevista de indignação política... Desculpe-me, mas isso é papo para muitas páginas...

É verdade, seria uma angústia desnecessária. Mas citei esse exemplo para ilustrar o fosso que separa o poder público municipal da sociedade, sobretudo dos agentes culturais como vocês da Taverna, que trabalham com formação de leitores e difusão do conhecimento...

Fazemos a nossa parte. Trabalho de Hércules necessário.

Vi que está na correria de lançamento do livro. Onde o leitor pode achá-lo, especialmente em São Gonçalo?

Em São Gonçalo, na Livraria Ler É Arte, que fica na Rua Moreira César, 97, loja 10, no Centro. Naquela galeria em frente a Igreja Matriz ou, então, no Cultural Bier, uma nova petiscaria que abriu na Parada 40, quase em frente ao Colégio Gonçalves Lêdo.

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