Dos paralelos da Rua Lenor às angústias de Beto no texto de Fábio Fonseca
RESENHA - Carlos Henrique dos Santos (Caíca)
Literatura e vida a andar juntas de mãos dadas sobre os precipícios da existência. Quem existe realmente nas histórias contadas por Fábio Fonseca? Quem narra e quem é narrado? Máscaras e metáforas se multiplicam nos contos do autor e fazem de nós leitores mais que simples leitores, somos também personagens dessas vidas literárias aparentemente tão reais que perpassam suas narrativas.
Para quem conhece e convive com Fábio (como eu) fica a certeza de que a vida nada mais é que uma história contada aos poucos, em frases, sonhos, desejos e uma boa dose de palavras bem organizadas, a ponto de pôr ordem nos caos da literatura nossa de cada dia.
Sim, nossa vida é literatura e nossa literatura é vida em forma de palavras, palavras essas que revelam um autor consciente do seu trabalho e das suas dores. Um autor que brinca a todo momento (será tudo isso verdade? É esse um livro auto-biográfico? Ou tudo não passa de invenção, de artimanha do autor para zombar da gente?). “na falsidade somos mais verdadeiros.” Está escrito em um dos contos, o que pra mim é a frase central e que define o conjunto que harmoniza o livro. É nessa falsidade literária, nessa grande metáfora da nossa existência que transitam as personagens (ou será apenas o personagem?) de Fábio Fonseca: Beto, Ana, Ana e Beto, todos juntos formando um ser apenas, um ser de papel, ossos e sentimentos, sentimentos que latejam, que pulsam, que ardem feito ferida recém adquirida e que guardará suas marcas por muito tempo.
Tempo, elo de partes que se encontram no texto. Ontem e hoje numa constante batalha para ver quem sai vencedor da vida. É no tempo também que se encontram personagens e narrador (quase todos em uma 1ª pessoa camuflada de alter - ego, ou seria o contrário disso?). Como num pequeno quebra-cabeças desses de crianças, com não mais de 60 peças, vamos encontrando ao longo da leitura do livro pequenas e simples partes que ao final se encaixam todas na moldura plena: há aqui uma tentativa de unificação do eu e das partes que o compõem, mas essas mesmas partes estão espalhadas pelos resquícios de passado que, supostamente, modelam a vida dessa narrador-autor-personagem de si mesmo.
Do primeiro passo, em primeira pessoa, da vida e obra metafórica, até o final epistolar, em que um eu não identificado (ou seria o próprio autor a escrever para si mesmo revelando ao leitor toda a verdade por trás da sua ficção?) somos guiados por uma viagem interior em busca do próprio eu, um eu mais real que a ficção pode oferecer, mas acima de tudo um eu ficcional construído por palavras e vida, como a boa literatura normalmente se constrói: pautada no real. Eu esse que se autoanalisa e nos oferece um retrato multifacetado de si mesmo. Um retrato real pintado com as tintas da ficção.
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